A lenta Agonia do São José

04/02/2013 00:00

A história da humanidade começou à margem dos rios.

Foi assim, com o surgimento das primeiras civilizações na Mesopotâmia, que em grego significa terra entre rios.  É um planalto de origem vulcânica, localizado entre os rios Tigre e Eufrates, em forma de lua crescente, daí o nome crescente fértil. Aí surgiram as primeiras cidades de que se tem notícia.

Bem, mas quando se fala de uma relação estreita entre um povo antigo e seu rio, nenhuma é tão marcante quanto a dos egípcios com o Nilo. Heródoto, o famoso historiador grego, que viveu no século V a.c, certa vez, ouviu dos sacerdotes egípcios que "O Egito é uma Dádiva do Nilo". Sem o rio, o Egito Antigo que conhecemos, certamente, nunca teria existido.

Grandes cidades nasceram às margens dos rios, como é o caso de Londres e do Tamisa, de Paris e do Sena. Um dos exemplos mais interessantes é o da nossa capital, que mesmo estando localizada no mar, brotou primeiramente à margem do Rio Paraíba, no entorno do Porto do Capim e só depois caminhou em direção à praia.

Cachoeira dos Índios foi edificada bem na margem esquerda do Rio São José. E não foi por acaso. O local foi estrategicamente escolhido pelos primeiros habitantes. De um lado a beleza exuberante do Serrote do Quati. De outro, sombra e água fresca do generoso São José.

Afluente do Rio do Peixe e subafluente do Piranhas, o São José é pequeno e temporário, mas de fundamental importância. Em suas águas os índios Icós, nativos da região, se banharam e pescaram.  Mais tarde os colonizadores buscaram água em época de cheia e escavaram cacimbas no leito seco, durante a seca, para saciar a sede e a dos seus animais, bem como suprir tantas outras necessidades.

Após a construção do cacimbão público da Rua da Mangueira (próximo do rio), dos reservatórios de Cachoeira da Vaca, Riacho do Meio, utilizados para abastecer a cidade e mais recentemente o açude de São Joaquim, a população esqueceu-se do rio, ignorou o seu nome e, principalmente, a importância para a civilização cachoeirense.

Ingratas, as pessoas viraram as costas para quem lhes deu a vida. Para quem, qual uma mãe que amamenta, lhes ofereceu a seiva que hidrata e nutre. Estranhos, os costumes dessa gente civilizada.

São décadas de abandono, de menosprezo, de indiferença. O São José, hoje, não passa de um depósito de lixo. Tudo vai parar lá: entulho de construção, resíduos de granjas da região, móveis velhos e tudo mais que as pessoas não mais querem em suas casas. Não raro se ateia fogo ao entulho e este mata e consome as ultimas árvores da extinta mata ciliar.

É um espetáculo cruel, uma agonia lenta e contida, assistida de camarote pelo poder público municipal e pelos cidadãos desta cidade. Ninguém se insurge contra a injustiça, as toneladas de entulho, a derrubada total das árvores, o abate de gado nas proximidades, o esgoto da cidade.

Sabemos, pois, que caso quisesse, a prefeitura teria condições de incentivar a recuperação das matas ciliares, proibir o depósito de entulho e a prática anti-higiênica de abater bovinos para abastecer os frigoríficos da cidade, inclusive, aplicando multa aos infratores.  Porém, a prefeitura, como bem sabemos, é a primeira a permitir que os esgotos sejam jogados no canal e direcionados ao rio sem nenhum tratamento.

Se com os rios deu-se início a civilização, é na civilização que os rios encontram o seu fatídico fim.